A honestidade virou notícia

Divulgado em 23/05/2017 - 12:37 por Crônica de Alex Magalhães

Tempos difíceis eram aqueles. Deixei meu currículo em várias empresas e nenhuma delas me chamou ao menos para realizar uma entrevista. Como estava iniciando a minha vida acadêmica, preferi ir trabalhar na Frente de Trabalho que sair de Porto Ferreira e perder a minha bolsa conquistada através do Enem.

E fora em um final de ano, em uma manhã qualquer, enquanto limpava a praça da matriz da cidade, que encontrei àquela carteira no chão. Como não era vidente, abri-a para saber quem era o dono. Logicamente vi que havia dinheiro nela, mas ao ver a foto do proprietário, imediatamente fui à agência bancaria que ele trabalha e perguntei pelo mesmo. O guarda que me atendeu disse que ele estava se preparando para entrar em serviço. Notifiquei a perda da carteira e a entreguei àquele profissional. Passados quase uma hora depois ele veio me agradecer. Fiquei surpreso porque a gratidão veio de uma pessoa que não era o dono do item perdido, mas do guarda que mal conhecia. O proprietário, de forma ordinária, teve a audácia de dizer para um grupo de pessoas que elogiava a minha ação, que eu não era tão honesto, porque fui abrir a carteira para saber o que tinha dentro, sendo que nenhum centavo ou outro documento fora retirado. Olhei bem para indivíduo e saí para não falar abobrinha ao mal caráter. O guarda que se tornou meu amigo e hoje trabalha em outro estabelecimento na mesma função, ficou indignado com atitude daquele mal agradecido.

No entanto, não é sobre esse fato de minha vida que vim escrever. O que me chamou atenção fora uma reportagem em um site de notícias de um taxista que encontrou uma carteira de um cliente com quatro mil reais e devolveu. É lógico que a ação honesta virou notícias. As redes sociais não foram o bastante e o homem se tornou herói. E essa que deveria ser uma pratica comum de todo o ser humano, tornou-se fato raro e é vista com espanto pela maioria das pessoas.

Por quê? Há alguma coisa demais em ser honesto? Para o mundo que carece de transparência e de pudor, a honestidade é uma figura tipicamente heroica. Não se trata de heroísmo alcançado em campos de batalhas! Não. É uma ação normal de um ser humano, dotado de inteligência, racional, que sabe o que é certo e errado. Será que a honestidade não estava presente quando houve o descobrimento do Brasil, ao Grito da Independência, à Proclamação da República? Por mais que a honestidade não seja uma figura tipicamente brasileira, será que ela não estava presente no tempo em que ainda havia política no Brasil?

O que entende-se é que a honestidade é uma figura tipicamente desconhecida. Parece não possuir domicílio certo. Seu habitat natural é a margem dos grandes acontecimentos. E – esse é o seu maior mistério, a chave de sua existência, o que espantou o Brasil quando o taxista, honesto, devolveu a carteira do cliente com quatro mil reais. Quisera em Brasília haver esse mesmo senso! Lindo seria para a democracia e a república de um governo moribundo, se todos os corruptos de Brasília começassem a devolver o dinheiro desviado dos cofres públicos ao devido proprietário.

Creio que no dia que isso acontecer, os pequenos indivíduos que praticam desonestidade em coisas mínimas e inquilinos que alugam os imóveis e depois saem devendo alugueis e deixam contas de água e luz sem pagar, também reconheceriam que é um obrigação ser honesto, ser “herói”. Quisera essa moda pegasse! Nem precisaria vir a escrever uma crônica para falar sobre o assunto, porque a honestidade, independente de gratidão ou não, seria a notícia mais popular do dia a dia. (Por Alex Magalhães)