Educação: Carta de uma mãe ao governador de São Paulo, onde sobram promessas e faltam professores

Divulgado em 29/06/2022 - 12:00 por Nelice Pompeu*

Sou mãe de um aluno do 2º ano do Ensino Médio, que estuda em uma escola da rede estadual localizada na periferia de São Paulo.

Estou muito preocupada com o futuro dele e de tantos outros jovens que está ameaçado, pois o governo paulista não tem cumprido o dever de garantir o direito à educação pública, gratuita, laica e de qualidade.

Sobram promessas,  faltam professores!

O que adiantam propostas supostamente inovadoras e reforma de currículos, se falta o principal: o professor.

Minha indignação de mãe, me levou a pesquisar o tema.

Fiquei chocada ao descobrir que há quase dez anos, o governo paulista não realiza concurso na área, e o resultado disso pode ser comprovado via Diário Oficial do Estado de São Paulo:

— Na Secretaria de Educação, há mais de 98 mil cargos alocados no banco de contingenciamento (Banco de Contingenciamento de Cargos e Empregos Públicos da Administração Direta e Autárquica do Estado – BCEP ), que foi criado pelo decreto nº 59.957, de 13 de dezembro de 2013. O BCEP reúne “cargos vagos e empregos públicos não preenchidos, considerados excedentes ou desnecessários no âmbito das Secretarias de Estado, da Procuradoria Geral do Estado e das Autarquias estaduais”.

— Os 98 mil cargos não podem ser preenchidos por meio de concurso público e estão congelados.

— Desses 98 mil cargos, 52,6 mil são de professor de educação básica II (lecionam português, história, matemática, entre outras disciplinas). 36 mil, de professor de educação básica I ( ensino infantil) e 8,58 mil agentes de organização escolar.

— De acordo com os dados de 2021, além dos 98 mil cargos congelados, havia 165,8 mil cargos vagos, a saber: 97,5 mil de professor de educação básica II, 47,2 mil para professor de educação básica e 18,5 mil de agentes de organização escolar.

Uma busca no site da secretaria de Educação mostra que, em 2014, foi lançado um concurso com 5,7 mil vagas para professores de educação básica nível I (através das instruções especiais SE Nº 02/2014).

Já para professor de educação básica II foi lançado concurso (instruções especiais SE Nº 02/2013) com 59 mil vagas, segundo notícias da imprensa da época.

É um absurdo termos na rede estadual de ensino público de São Paulo apenas 14,1% dos cargos ocupados por professor de educação básica I e 37,4%, por professor educação básica II.

Essa situação é negligenciada pelo próprio governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (Democratas), quando declara com naturalidade: se tem 22% de aulas não dadas, tem 78% de aulas dadas, e com a expansão do ensino integral é natural que vai falta professor.

Nada, nada mesmo, substitui a atividade docente. Isso inclui desde as gambiarras pedagógicas — por exemplo, preencher as aulas vagas com conteúdo gravado —  à contratação no atropelo  de professores sem a formação adequada.

Senhor governador, e se fosse com seus filhos?

O próprio ex-secretário de educação, Rossileli Soares, afirmou que temos uma das piores educação do mundo.

Seria consequência do descaso com que o governo no poder desde 1995 trata a educação?

Esse mesmo ex-secretário nunca recebeu as famílias da escola pública, mas dava livre acesso a um grupo de mães com filhos em escolas da elite.

Será que o aluno da escola pública vale menos?

O acesso à educação é condição fundamental para superar o abismo social existente no país. Porém, o modelo tecnocrata implementado pelo novo ensino médio e o programa de escolas em tempo integral só agravam a evasão escolar.

Muitos colegas do meu filho abandonaram os estudos, já que não conseguem conciliar escola e trabalho, enquanto o governo fecha salas, especialmente do ensino noturno e de ensino para jovens e adultos.

Além disso, é possível constatar o avanço da terceirização nas escolas estaduais, que precarizam as condições de trabalho e desrespeitam direitos trabalhistas, como os atrasos sistemáticos no pagamento de salários.

Senhor governador, não desejo para o meu filho uma escola pública que limita sonhos e prejudica o seu futuro.

*Nelice Pompeu é professora da rede pública municipal da cidade de São Paulo. Integra o Movimento Escolas em Luta

Fontewww.viomundo.com.br