Essas emendas impositivas adotadas no Congresso Nacioanal criou um modelo que gasta muito, entrega pouco e presta contas de menos.
Nas últimas duas décadas, especialmente após os anos 2010, o Congresso Nacional brasileiro deixou de ser apenas um fiscalizador do orçamento para assumir o protagonismo na sua definição. Esse avanço se materializa, sobretudo, na explosão das emendas parlamentares.
O resultado é visível: em 2010, os recursos destinados às emendas somavam R$ 7,9 bilhões; em 2024, ultrapassam os R$ 44,6 bilhões — maior valor da história.
Esse novo cenário impacta diretamente a estrutura do orçamento federal. Enquanto em 2014 as emendas representavam apenas 3,95% das despesas discricionárias, em 2020 saltaram para 28,78%. Para 2024, a estimativa é de que alcancem cerca de 20%. Com a criação das chamadas “emendas de relator” (RP9) em 2020 — base do chamado “orçamento secreto”, no qual tivemos inúmeras denúncias de desvios de finalidade e falta de total transparência.
O novo arranjo fortaleceu a lógica de distribuição direta, especialmente via transferências especiais — apelidadas de “PIX orçamentário” — que dispensam convênios e prestações de contas rigorosas. A maior parte dos recursos vai para áreas eleitoralmente rentáveis, sem planejamento no futuro do país.
Instituições de controle público apontam para um conjunto de distorções geradas por esse modelo. A principal crítica é a fragmentação orçamentária, com milhares de pequenos projetos locais, muitas vezes desvinculados de prioridades nacionais. Essa pulverização compromete o planejamento de longo prazo e a coordenação de políticas públicas estratégicas.
Além disso, a eficiência na aplicação dos recursos é frequentemente questionada. É comum a existência de obras inacabadas, mal dimensionadas ou sem impacto socioeconômico relevante, reflexo da ausência de critérios técnicos e da pressão por entregas eleitoreiras.
Outro ponto sensível é o clientelismo institucionalizado. Em vez de fortalecer a representação republicana, o sistema tem alimentado relações de dependência entre o Executivo e parlamentares, trocando apoio político por liberações orçamentárias. Essa prática corrói a transparência e dificulta o controle social sobre os recursos públicos.
O modelo também pressiona as contas públicas. Como as emendas são de execução obrigatória, elas reduzem a flexibilidade do governo em momentos de contenção de gastos, podendo comprometer áreas essenciais como infraestrutura, ciência ou cultura. Soma-se a isso o desequilíbrio federativo, pois municípios com maior influência política costumam ser mais beneficiados, ampliando as desigualdades regionais.
Conclusão: um sistema caro e ineficiente – A centralização orçamentária no Congresso marca uma mudança de paradigma na relação entre os Poderes da República. Se, por um lado, fortalece o papel dos parlamentares em responder às demandas locais, por outro, transforma o orçamento público em uma arena de barganha política e fragmenta a ação do Estado.
A crítica central é dura, mas precisa: o Brasil adotou um modelo que gasta muito, entrega pouco e presta contas de menos. Um sistema que fortalece interesses eleitorais imediatos em detrimento de um planejamento público racional, eficiente e igualitário. Enquanto isso, o cidadão segue distante das decisões que moldam o destino dos recursos que ele mesmo financia.
Fonte: Paulo Gala