Líder de Igreja Evangélica preso é apontado como operador financeiro em esquema de desvio de verbas da Saúde
A política municipal de Sorocaba (SP) mergulhou em uma crise de confiança e integridade. A prisão do bispo Josivaldo Batista, líder da Igreja Cruzada dos Milagres dos Filhos de Deus, chocou a comunidade e expôs um complexo esquema de corrupção que culminou no afastamento do prefeito Rodrigo Manga (Republicanos) por ordem da Justiça Federal.
O caso, investigado pela Polícia Federal (PF) na segunda fase da Operação Copia e Cola, levanta questões críticas sobre a promiscuidade entre a administração pública e figuras religiosas, que supostamente desviaram recursos vitais, especialmente da Saúde, para o enriquecimento ilícito.
O bispo Josivaldo Batista não é apenas um aliado político do prefeito, mas seu concunhado, casado com a pastora Simone Rodrigues Frate de Souza, também detida. Segundo a PF, Josivaldo atuava como o principal operador financeiro do esquema.
A investigação encontrou evidências contundentes que detalham a mecânica dos desvios. Em abril, na primeira fase da operação, o casal foi flagrado com R$ 903 mil em espécie. Um envelope marcado com “Prett” apontava para Fernando Francisco Prette, sócio de uma empresa contratada pela prefeitura, sugerindo uma origem ilícita direta.
Contudo, a prova mais incriminadora veio do celular do bispo. A PF encontrou um documento de texto no aplicativo de notas, descrito como uma “contabilidade paralela” de propinas. Estruturada em “entradas” e “saídas”, a anotação, modificada horas antes da batida policial, registrava cifras que variavam de R$ 30 mil a R$ 2,8 milhões, que seriam supostamente propinas pagas por empresas contratadas.
As “saídas”, em linguagem cifrada e com abreviações, indicavam o dinheiro distribuído a secretários municipais e aliados políticos, evidenciando uma rede de distribuição de recursos desviados.
O aspecto mais perturbador da Operação Copia e Cola é a suspeita de que a própria Igreja Cruzada dos Milagres dos Filhos de Deus foi usada como instrumento de lavagem de dinheiro.
A quebra do sigilo bancário da instituição revelou 958 depósitos em espécie, totalizando R$ 1,7 milhão, no período investigado. Pelas contas pessoais do bispo, passaram R$ 2,6 milhões em 2.221 depósitos em dinheiro vivo. A PF aponta que a igreja servia de rota para “esquentar” o dinheiro das propinas, muitas vezes dissimulado por um contrato de publicidade com uma empresa registrada em nome da primeira-dama, Sirlange Rodrigues Frate Maganhato.
A utilização de um líder eclesiástico e de uma instituição de fé como fachada ou ferramenta operacional para o desvio de verbas públicas essenciais, como as da Saúde, representa uma dupla traição.
- Traição à Fé e aos Fiéis: Um líder que deveria guiar moralmente sua comunidade é apontado como facilitador da corrupção, manchando o nome da instituição religiosa e instrumentalizando a confiança dos fiéis para operações financeiras ilícitas.
- Traição ao Povo: O desvio de recursos da saúde, um setor historicamente vulnerável, demonstra um desprezo pela vida e pelo bem-estar dos cidadãos. O dinheiro que deveria ser aplicado em leitos, medicamentos e equipamentos foi transformado em “entradas” e “saídas” de propina, uma demonstração cínica de priorização do lucro pessoal sobre o serviço público.
Este caso em Sorocaba não é isolado e sublinha a urgência de maior transparência e fiscalização na interação entre o poder público e entidades de qualquer natureza que se beneficiem de contratos ou isenções governamentais. A confusão entre a busca espiritual e a ambição material mina as bases democráticas e éticas da sociedade.
Em meio ao escândalo, o prefeito Rodrigo Manga, através de sua defesa, negou veementemente qualquer irregularidade. Em nota, os advogados sustentam que o prefeito é vítima de “perseguição política” e que a investigação da Polícia Federal é “completamente nula,” tendo sido iniciada e conduzida de forma ilegal por “autoridade manifestamente incompetente.”
A defesa também questionou o afastamento, classificando-o como “temerário” e baseado em “ilações”, citando a falta de contemporaneidade dos fatos investigados (que remontam a 2021) para justificar a interrupção do mandato legítimo.
Enquanto a Justiça avalia o pedido de recurso, o vice-prefeito Fernando Martins da Costa Neto assumiu o cargo interinamente, garantindo a continuidade administrativa da Prefeitura de Sorocaba. A decisão judicial, no entanto, coloca em xeque a credibilidade de um mandato e reforça a necessidade de um escrutínio rigoroso sobre como o dinheiro público é gerido e, em última instância, desviado.







