Relatório ultrarrápido na Câmara tentava impor ‘anuência’ de governadores em investigações, blindando o crime organizado e a estrutura política sob pretexto de segurança.
Em um movimento legislativo de extrema velocidade e controvérsia, o deputado Guilherme Derrite (PL-SP), recém-designado relator do projeto anticrime “Pec das Facções”, apresentou seu parecer duas horas após ser anunciado no cargo.
A rapidez levantou a suspeita de que o relatório já estaria pronto, servindo como um “biombo de interesses” para proteger figuras políticas sob o apelo popular do tema segurança pública.
A mudança mais substantiva e polêmica do relatório é a que condiciona a participação da Polícia Federal (PF) na investigação e repressão do crime organizado à anuência prévia do governador do Estado.
O deputado, candidato ao Senado, justificou a medida alegando maior experiência das polícias locais no combate ao crime. No entanto, o histórico recente sugere que a motivação real está na autoproteção do próprio Congresso.
A investida contra a autonomia da Polícia Federal ocorre em um momento crucial. Ações em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) e operações como a Carbono Oculto trouxeram à tona indícios de que emendas parlamentares e o crime organizado estão interligados, utilizando inclusive as mesmas fintechs em São Paulo para lavagem de dinheiro e ocultação de patrimônio.
Um exemplo claro surgiu dois dias antes da escolha de Derrite: uma operação no Piauí, Maranhão e Tocantins constatou infiltração do PCC em uma rede de postos de combustíveis. A investigação só avançou graças ao compartilhamento de dados da Operação Carbono Oculto, deflagrada pelo MPSP, Receita e PF.
A Operação Carbono Oculto, que relaciona devedores contumazes do setor de combustíveis com o crime organizado, também expôs o aliado de Ciro Nogueira ( senado dor PP pelo Piauí e presidente do partido político do Derrite), e pressionou o debate sobre o PL do devedor contumaz no Senado.
O próprio Nogueira tem tido dificuldades em se desvencilhar de emendas que excluíam o setor de combustíveis do escopo do projeto, revelando como a pauta anti-crime organizado toca diretamente no núcleo da estrutura política.
O enfraquecimento da PF é visto como o mais recente capítulo de um padrão na Câmara dos Deputados, liderada por parlamentares e líderes do Centrão, que têm tentado barrar avanços legislativos no combate ao crime organizado.
O PL do devedor contumaz, aprovado no Senado, estagnou na Câmara, enquanto a PEC da blindagem passou na Câmara, mas foi barrada no Senado. Agora, a Câmara articula a neutralização do principal órgão de repressão.
A investida beneficia também o Executivo em alguns estados. O governador do Rio, Cláudio de Castro, por exemplo, tentou anular a interdição da Refinaria de Manguinhos, um dos resultados da Carbono Oculto, e agora se vê diante de um inquérito da PF determinado pelo ministro Alexandre de Moraes, evidenciando como a PF autônoma pode ser um obstáculo para governos locais.
A ofensiva do governo federal em defesa da Polícia Federal agora enfrenta o desafio de mobilizar a opinião pública, para evitar que o Centrão enfraquece o poder de investigação da Polícia Federal contra: facções criminosas, quadrilhas de políticos que desviam recursos através das emendas parlarmentares sem transparência – principalmente entre 2017 e 2023.
Fonte: Valor Econônomico







