Porto Ferreira “história em instantes”: Dr. Erlindo Salzano e as Eleições de 1950 – parte 2

As aproximações entre o Dr. Erlindo Salzano e Adhemar de Barros, nos anos 40, resultaram na construção de uma sólida amizade, baseada na confiança. Adhemar inseriu Erlindo no cenário político, ao designá-lo para ocupar cargos de confiança na administração do Governo do Estado de São Paulo.

Entretanto, em pouco tempo, Erlindo se tornou o principal articulador político de Adhemar de Barros. Em 1949, passou a se encontrar, secretamente, com o homem que havia permanecido 15 anos no poder: Getúlio Vargas[1].

O objetivo destas visitas, no princípio informais, visava costurar um apoio político consistente, para que Adhemar de Barros, naquele momento, governador do Estado de São Paulo, candidatasse-se à presidência da República, nas eleições de 1950[2].

Os resultados destas artimanhas do poder alçaram a candidatura do Dr. Erlindo Salzano ao cargo de vice-governador do Estado, em uma chapa apoiada por Adhemar de Barros, que teve seus planos frustrados, e Getúlio Vargas, para presidente, projetando-se, assim, os alicerces da República Populista (1945-1964) na política brasileira.

AS RELAÇÕES COM GETÚLIO VARGAS

De acordo com Erlindo Salzano “Getúlio, senador pelo Estado do Rio Grande do Sul, mantinha um exílio voluntário em suas propriedades rurais do município de São Borja. Muitas viagens destinavam-se encontrar com Getúlio Vargas em suas propriedades rurais. “Tudo era feito sob o máximo sigilo”[3].

O objetivo destas viagens ficara esclarecido: convencer Getúlio Vargas a apoiar à candidatura de Adhemar de Barros para presidente. Juntos seriam invencíveis. E realmente o foram, porém, não da forma como Adhemar projetara.

“Depois de vários encontros, acabei verificando que, por sua vez, Getúlio, sem jamais expressá-lo, esperava obter o apoio de Adhemar”[4], relatou Erlindo. Vargas foi um político muito astuto. Jogava na defensiva. Havia recebido muitas visitas de pretensos candidatos, os quais propunham acordos políticos, contudo, sabia muito bem o que queria.

Sem instruções precisas de Adhemar, Erlindo continuava suas visitações a Getúlio Vargas, às vezes, a pedido do próprio Vargas. Getúlio apreciava uma boa conversa e evitava assuntos de relevância política. Com o passar do tempo, Erlindo seguia sozinho ao encontro de Vargas, constituindo-se no papel de articulador político das eleições de 1950.

Vargas sabia que o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) não tinha forças suficientes e nem capital para lançar a sua candidatura[5]. Ao mesmo tempo, o Partido Social Progressista (PSP), de Adhemar de Barros e Erlindo Salzano, era o mais forte e estruturado do Estado de São Paulo, mas, não concentrava poder de voto nos outros estados brasileiros[6]. Erlindo percebeu esta situação e, ao notar quais eram as intenções de Vargas, tornou-se partidário da ideia de lançá-lo como candidato à presidência, com o apoio de Adhemar. Faltava convencer Adhemar desta realidade, sem que ele rompesse com as negociações. Nas palavras de Salzano:

“Quando Getúlio lobrigou(enchergou) a possibilidade de ser um candidato lançado e apoiado por Adhemar, pela primeira vez, diante de mim, perdeu a serenidade que sempre demonstrou e, andando de um lado para o outro, com os braços cruzados nas costas, exclamou: “Se Adhemar me apoiar, eu revolverei este País de Sul a Norte, numa nova cruzada”[7].

Erlindo conseguiu convencer Adhemar sobre a fraca projeção nacional do PSP, como força eleitoral, e que se Adhemar fosse candidato a presidente, dificilmente conseguiria eleger um sucessor ao Governo do Estado de São Paulo, risco o qual não poderiam correr, por questões de sobrevivência política[8]. Em poucas palavras, se Adhemar lançasse candidatura própria, o PTB de Getúlio poderia seria uma grande ameaça, ao se unir com a UDN (partido da base governista de Dutra), porém, unidos com Vargas, a vitória estaria garantida nos níveis estadual e federal.

Em 19 de março de 1950, ocorreu o encontro crucial. Erlindo Salzano e Danton Coelho – homem de confiança de Vargas – partiram para Santos Reis, a fim de se encontrarem com Getúlio Vargas. Durante a reunião, Salzano articulou para que o apoio de Adhemar à candidatura de Vargas resultasse em compromissos compensadores, os quais seriam firmados mediante um documento, o qual ficou conhecido com “O Protocolo de Santos Reis”.

As cláusulas foram as seguintes:

  • a) formar a união dos srs. Adernar de Barros e Getúlio Vargas, isto é, estabelecer uma frente chefiada pelos dois líderes acima referidos;
  • b) manter sigilo em torno dessa resolução até quando ambos julgarem oportuna a sua divulgação;
  • c) considerando as dificuldades que a desincompatibilização do sr. Adernar de Barros criará à frente e as fatais conseqüências de grave caráter no cenário político-administrativo nacional, esse líder admitiu a inviabilidade de sua candidatura no momento atual;
  • d) aceitar como candidato mais conveniente da citada frente o sr. Getúlio Vargas;
  • e) fusão futura das forças de ambos os líderes em um grande partido nacional, cuja chefia caberá ao sr. Adernar de Barros, uma vez vitoriosa a frente e eleito o sr. Getúlio Vargas;
  • f) deixar para ulterior discussão entre ambos os líderes pessoalmente a posição futura do sr. Ademar de Barros, tomando em consideração a proposta apresentada pelo sr. Erlindo Salzano, sobre a renúncia do candidato eleito pela frente à Presidência da República e lançamento do sr. Ademar de Barros à sua sucessão;
  • g) uma vez os dois líderes presentes, assentarem definitivamente em data que eles marcarem, as resoluções finais que serão lançadas em documento mantido na posse de ambos, em segredo[9].

Segundo Salzano, Adhemar ficou satisfeito com acordo firmado[10]. Em Santos Reis, também ficou decidido que os candidatos aos cargos de Governador, Vice-Governador e Senador de São Paulo, seriam escolhidos livremente por Adhemar, recebendo o apoio de Getúlio e do PTB[11].

No dia 02 de abril, véspera da data limite para desincompatibilização, Adhemar fez um pronunciamento, no qual assumiu que não renunciaria ao mandato de governador, e, desta forma, abriria mão das disputas presidenciais[12]. Durante os meses de abril, maio e junho Erlindo Salzano ainda absorveu uma carga excessiva de responsabilidade para manter firme a posição tomada por Adhemar de Barros em apoiar Vargas.

Enfim, o jornal impresso “O Ferreirense”, de 18 de junho de 1950, trouxe a seguinte nota, assinada pelo pseudônimo CAS:

“O governador paulista anunciou que vai lançar a candidatura do senador Getúlio Vargas à presidência da Republica. Vai lançar a candidatura, tirar o paletó e trabalhar por ela no país inteiro. Se isso acontecer, meus senhores, os chamados partidos conservadores vão passar mãos bocados. Por menos que se queira reconhecer, são duas ponderáveis forças políticas que se unem. Derrotá-las juntamente é trabalho para gigantes”[13].

Estabeleceram-se, portanto, os acordos para o apoio de Getúlio Vargas ao cargo de presidente da República, numa aliança PTB-PSP. Segundo Salzano, “como aconselhado, Adhemar lançou a candidatura de Getúlio com grande pompa, junto ao Monumento da Independência, em frente ao Museu do Ipiranga. Era um espetáculo digno de ver-se, começo condigno da campanha que viria”[14]. Faltava-se, então, estabelecer quais seriam os candidatos a governador e a vice-governador do Estado de São Paulo.

Em conclusão, o Dr. Erlindo Salzano se tornou um dos articuladores das eleições de 1950. Foram exatamente as relações desenvolvidas com Getúlio Vargas, em nome de Adhemar de Barros, e o reconhecimento pelo seu papel desempenhado nas visitas e negociações de apoio, os responsáveis pelo crescimento político e indicação do Dr. Erlindo Salzano como candidato a Vice-Governador do Estado de São Paulo.

Enfim, na política, pode-se valer do ditado popular, no qual “uma só andorinha não faz o verão”.

Nota: as citações de Erlindo Salzano estão contidas no livro “A Campanha de 50: Aliança Adhemar Getúlio”, editora Edameris, escrito por ele em primeira pessoa.

* Por Renan Arnoni – Historiador (UNESP – Franca); Pós-graduação em Gestão Cultural; Especialização em Análise Comportamental, Programação Neolinguística e Constelação Sistêmica Familiar; Servidor Público (Prefeitura Municipal de Porto

  • [1] Cf. SALZANO, Erlindo. A Campanha de 50. São Paulo: EDAMERIS, p.25.
  • [2] Ibidem, p.26.
  • [3] Ibidem, p.25.
  • [4] Ibidem, p.26.
  • [5] Ibidem, p.27.
  • [6] Ibidem, p.24-25.
  • [7] Ibidem, p.39.
  • [8] Ibidem, p.37-38.
  • [9] D’ARAUJO, Maria Celina Soares. O segundo Governo Vargas (1951-1954) democracia, partidos e crise
  • política. 2. ed. São Paulo: Ática, 1992. 206 p. anexo II p.82-83.
  • [10] Cf. SALZANO, Erlindo. A Campanha de 50. São Paulo: EDAMERIS, p.40.
  • [11] Ibidem, p.39.
  • [12] Ibidem, p.41
  • [13] Cf. “O FERREIRENSE”, 10/06/1950, num.823, p.1.
  • [14] Cf. SALZANO, Erlindo. A Campanha de 50. São Paulo:EDAMERIS, p.49.

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