Lideranças bolsonaristas, que historicamente atacavam o Centrão como “antro de corruptos”, agora se submetem ao grupo para anistiar Jair Bolsonaro, aprofundando a tática do “Toma-Lá-Dá-Cá” do Centrão
Em 2018, no auge da campanha presidencial, o general Augusto Heleno definiu o Centrão com uma frase que ecoava o discurso anticorrupção de Jair Bolsonaro: “É a materialização da impunidade”.
Naquele palanque, o então candidato cantou uma música que ironizava o grupo, simbolizando tudo o que seu movimento prometia combater: o toma-lá-dá-cá, a negociata e a blindagem de políticos profissionais.
Quatro anos depois, a ironia se consuma de forma crua. Os herdeiros políticos daquele discurso moralista não apenas se aliaram ao que juravam destruir, mas tornaram-se seus fiadores mais fervorosos.
A aprovação da chamada PEC da Blindagem ou melhor “PEC da Bandidagem” na Câmara dos Deputados na última terça-feira (16/09) é o monumento definitivo dessa submissão, uma transação política onde o produto final é a impunidade.
O acordo é claro: em troca do apoio crucial do Centrão a um futuro processo de anistia para Jair Bolsonaro, os bolsonaristas do PL colocaram sua bancada a serviço da PEC que beneficia diretamente os mesmos políticos que eles acusavam de “atrasar o desenvolvimento do país”.
A regra, que segue para o Senado, impede abertura de processos contra parlamentares sem a chancela da Casa, por votação secreta, um salvo-conduto para investigados por corrupção
A rendição bolsonarista ao Centrão não é de hoje. Começou em 2020,, em um momento de “desespero” do então presidente, que perdia apoio no Congresso. A saída foi se render às demandas do grupo, assinando a criação do mecanismo das emendas de relator, o famigerado e corrupto “orçamento secreto“, que concedeu a deputados e senadores poder sem precedentes sobre o dinheiro suado dos brasileiros pagadores de impostos, sob o comando do parlamentares do Centrão – PP, União Brasil (na época PSL), MDB, PSD, Republicanos e PL.
A farra com recursos públicos, sem transparência ou comprovação de eficiência, fortaleceu o Legislativo e o Centrão. Agora, com as investigações avançando e “colocando muitos deles contra a parede”, a conta da festa começou a chegar. Ameaçados por processos no STF, a elite do Congresso precisava de uma escapatória.
A solução veio do mesmo lugar que o orçamento secreto: do desespero bolsonarista. O Centrão percebeu que a bancada de Bolsonaro faria “qualquer coisa para esticar a corda da relação com o STF” e salvar o ex-presidente. A PEC da Blindagem, o melhor a “PEC da Bandidagem”, foi a moeda de troca.
Quem atacava o Centrão e fazia discursos inflamados contra a impunidade resolveu, em causa própria, unir-se a ela. O PL apoiou maciçamente a medida, tornando sua aprovação viável. A impunidade que valia como crítica em 2018 tornou-se o objetivo em 2023, servindo tanto para a corrupção quanto para o golpe.
Fonte: Estadão – Texto original de Ricardo Corrêa