MP investiga contratações milionárias de artista com pouca relevância pela prefeitura de SP, revelando um caso emblemático de desvio de moralidade e impessoalidade na administração do MDB paulistano.
A Promotoria do Patrimônio Público e Social do Ministério Público de São Paulo deu um passo crucial para jogar luz sobre um esquema que fere os princípios mais básicos da administração pública: a impessoalidade e a moralidade.
A instauração de um inquérito civil para investigar os pagamentos da prefeitura ao cantor Davi Goulart, primo do secretário municipal de Cultura, Rodrigo Goulart (MDB), expõe uma prática que beira o escárnio ao erário.
O caso, em seus detalhes, é um retrato acabado do que não deve ocorrer na gestão do dinheiro público. Davi Goulart, um cantor sertanejo que, de acordo com a apuração, possui apenas sete ouvintes mensais no Spotify, foi elevado ao status de artista “consagrado” pela Secretaria de Cultura para justificar uma série de contratações diretas, sem licitação.
O custo dessa “consagração” administrativa? R$ 50 mil por show, totalizando R$ 880 mil nos últimos dois anos da gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB), com uma conta adicional de R$ 50 mil prestes a ser empenhada.
A justificativa legal para dispensar a concorrência pública é a de que se trata de um profissional notório e de conhecimento público. Contudo, a dissonância entre o termo “consagrado” e a realidade de um artista com audiência ínfima nas plataformas digitais levanta uma questão moral inescapável: a quem, de fato, se destina essa consagração? À qualidade artística ou ao parentesco com o gestor?
A teia de interesses se aprofunda. Investigação apontou que o próprio secretário Rodrigo Goulart, quando vereador licenciado, destinou R$ 700 mil em emendas parlamentares para o Circuito Cultural de Rua, programa da prefeitura do qual sua pasta é responsável. Nos dois meses seguintes a esses repasses, seu primo, Davi, foi contratado três vezes, somando R$ 425 mil em cachês.
Em nota, a Secretaria de Cultura limitou-se a afirmar que todas as contratações seguem “critérios legais” e incluem documentação que “atesta a consagração” dos artistas.
A defesa, porém, não responde ao cerne da crítica: a razoabilidade e a moralidade por trás de pagar R$ 50 mil a um artista sem expressão no mercado, especialmente quando esse artista é parente do secretário que comanda a pasta.
Este caso vai além de um simples inquérito. Ele serve como um sintoma de uma cultura enraizada na má gestão, onde o nepotismo e o fisiologismo se disfarçam de legalidade formal.
Fonte: O Globo