Apesar da desaceleração da inflação, a Argentina vê o peso argentino sob forte pressão cambial, com fuga de capitais, esgotamento de reservas e sinais de perda de confiança no plano econômico do governo do presidente “ Motoserra ”
Nos meses de julho, agosto e setembro de 2025, a Argentina viveu uma crescente instabilidade cambial, marcada pela deterioração da moeda local, intervenções urgentes da autoridade monetária e uma combinação de fatores políticos e econômicos que reacenderam temores sobre a sustentabilidade do modelo vigente.
Inflação – em julho, os preços subiram cerca de 1,9% em relação ao mês anterior, mantendo-se abaixo da marca de 2%. Em agosto, a inflação anual caiu para cerca de 33,6% — a mais baixa desde julho de 2018 — e o aumento de preços mês a mês ficou próximo de 1,9%. Em setembro, contudo, a inflação mensal subiu para cerca de 2,0% (ou 2,08%) e a taxa anual caiu para cerca de 31,8%.
Cambio – apesar da aparente desaceleração da inflação, a situação do câmbio se deteriorou. O modelo de banda de flutuação da moeda — estabelecido pela Banco Central da República Argentina (BCRA) — oferecia algum grau de “contenção”, mas dependia significativamente das reservas em moeda estrangeira. Analistas destacam que as reservas líquidas permanecem muito limitadas.
Por exemplo, em meados de setembro, com o câmbio ultrapassando a faixa superior estabelecida, o BCRA foi forçado a intervir com vendas de dólares para conter a queda do peso. Essa conjuntura evidencia que, mesmo com inflação sob ‘controle’ temporariamente, a vulnerabilidade cambial segue elevada.
Desconfiança – a instabilidade econômica se entrelaça com eventos políticos recentes. Em setembro de 2025, uma derrota expressiva do governo de Milei na província de Buenos Aires gerou forte impacto nos mercados: os títulos argentinos em dólares despencaram e o risco-país saltou. A perda de confiança no governo reforçou a pressão sobre o câmbio e os ativos argentinos.
Diante desse quadro, o BCRA e o governo adotaram medidas de aperto financeiro: exigência mais alta de reservas para bancos, encarecimento das taxas e restrições de liquidez, tudo na tentativa de evitar que os capitais fugissem rapidamente em direção ao dólar. Por outro lado, o governo manteve políticas de austeridade, corte de gastos públicos e tentativas de restaurar disciplina fiscal, fatores que contribuíram para a queda da inflação mas também geraram menor crescimento e maior sensibilidade externa.
O paradoxo argentino neste período é evidente: por um lado, o governo conseguiu derrubar a inflação de níveis quase 200% ao ano para cerca de 30% ao ano. Por outro, essa “conquista” se dá ao custo de aumento da pobreza, queda enorme do poder de compra da maioria da população e por outro lado existe a sombra de uma moeda vulnerável e de reservas frágeis. A armadilha é que, caso o peso venha a se desvalorizar abruptamente, o impacto sobre os preços pode reaparecer rapidamente, corroendo a aparente vitória anti-inflacionária.
Riscos – dentre os riscos a observar:
- Nova fuga de capitais, em especial se houver sinais de reversão das reformas ou instabilidade política.
- Pressão sobre os preços internos, via repasse de câmbio (pass-through), se o peso desvalorizar.
- Impacto sobre empresas exportadoras e importadoras: uma moeda muito fraca afeta custos, dívida em dólares e competitividade.
- Reação social: cortes nos gastos públicos e política de austeridade têm custo político e social, especialmente em um país historicamente marcado por inflação alta, desvalorização e recessão.
Para os cidadãos, mesmo com inflação menor, o poder aquisitivo segue sob pressão, e o risco de nova depreciação do peso implica em incerteza para poupança, investimento e decisões do dia-a-dia.
Fonte: El pais