Sob comando de Guilherme Piai, pasta arquivou apuração sobre contratos de R$ 50 milhões do programa Melhor Caminho enquanto o Ministério Público investiga o caso e já obteve bloqueio de bens de servidores e empresas.
Documentos oficiais revelam que a atual gestão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, chefiada por Guilherme Piai, atuou para encerrar apurações internas sobre suspeitas de irregularidades em contratos milionários do Programa Melhor Caminho, voltado à reforma de estradas rurais.
A manobra administrativa, que envolveu a criação de comissões e grupos técnicos, resultou no arquivamento das investigações internas, mesmo diante de indícios que levaram o Ministério Público paulista (MPSP) a abrir 147 inquéritos e mover 12 ações civis públicas.
Os contratos sob suspeita somam R$ 50 milhões e tiveram os valores elevados por meio de aditivos assinados em dezembro de 2022, no fim do governo Rodrigo Garcia (PSDB). As justificativas para os reajustes — como pandemia de Covid-19 e Guerra da Ucrânia — foram consideradas frágeis pela Promotoria, que viu ausência de demonstração de desequilíbrio econômico-financeiro.
Em junho de 2023, já no início do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), o então secretário Antonio Junqueira encaminhou o caso ao MPSP, ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) e à Controladoria-Geral do Estado (CGE).
No entanto, após a saída de Junqueira, em outubro do mesmo ano, o novo titular Guilherme Piai e o atual secretário-executivo Alberto Amorim assumiram o controle das apurações internas e frearam as investigações dentro da pasta.
Uma Comissão de Apuração Preliminar foi criada, mas logo concluiu não ter “capacidade técnica” para avaliar os cálculos e recomendar punições. Em seguida, Piai instituiu um Grupo Técnico de Trabalho, que em junho de 2024 concluiu que os contratos estavam regulares e que as supostas irregularidades se tratavam de “meros erros materiais”.
Dois dias após o parecer, Piai enviou ofício ao procurador-geral de Justiça, Paulo Sergio de Oliveira e Costa, comunicando o arquivamento do caso na esfera administrativa. A iniciativa foi vista por servidores e membros do MPSP como uma tentativa de “limpar a área” antes do avanço das investigações externas.
Trocas suspeitas – a sequência de exonerações e recontratações também levanta suspeitas. O ex-chefe de gabinete Ricardo Lorenzini, demitido em março de 2023, foi recontratado meses depois, sem anuência do então secretário Junqueira e hoje ocupa o cargo de subsecretário de gestão corporativa, responsável por contratos e licitações. Já o servidor Henrique Fraga, que assinou os aditivos em série, é alvo de nove ações civis movidas pelo MPSP.
O promotor Ricardo de Barros Leonel aponta que os reajustes foram concedidos de forma genérica, sem análise individualizada, beneficiando cerca de 150 contratos simultaneamente. Em duas ações, a Justiça determinou o bloqueio de bens de servidores e empresas, que somam cerca de R$ 5 milhões.
Leniência com dinheiro público – o discurso de transparência contrasta com a prática de engavetar apurações sensíveis e reabilitar servidores investigados. O episódio evidencia a tentativa de blindagem política dentro da máquina administrativa, enquanto o Ministério Público busca responsabilizar os envolvidos.
Com o caso ainda em curso, o contraste entre o arquivamento interno e o rigor da Promotoria expõe o risco de a Secretaria de Agricultura paulista transformar-se em exemplo de como a burocracia pode servir para encobrir e não revelar indícios de corrupção.
Fonte: Metropoles