Monitorado por tornozeleira eletrônica, ex-diretor da PRF deixou o estado, rompeu regras judiciais e só teve fuga comunicada à Polícia Federal 27 horas depois; atraso levanta suspeitas de incompetência ou conivência
A fuga do ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques Marques, aliado político do bolsonarismo, escancara uma sequência de falhas ou, no mínimo, omissões graves da Polícia Penal de Santa Catarina, responsável pelo monitoramento eletrônico do investigado.
Segundo informações unânimes reunidas até agora, Silvinei deixou o prédio onde morava, em São José, na Grande Florianópolis, às 19h22 do dia 24/12. Imagens das câmeras de segurança do condomínio mostram o ex-diretor da PRF colocando bolsas no porta-malas e no banco traseiro de um carro possivelmente alugado. Entre os itens, havia ração e vários pacotes de tapetes higiênicos para cães. Em seguida, ele entrou no veículo vestindo calça de moletom e camiseta, acompanhado de um cachorro e deixou o local.
A violação da tornozeleira eletrônica, usada por Silvinei desde agosto de 2024, só foi constatada horas depois. De acordo com a Polícia Penal de Santa Catarina, que opera as Centrais de Monitoramento Eletrônico (CME), o equipamento ficou sem sinal de GPS por volta das 3h da madrugada do dia 25/12, impedindo a localização do monitorado. Por volta das 13h do mesmo dia, o sistema também perdeu o sinal de GPRS, possivelmente em razão do esgotamento da bateria.
Mesmo diante de indícios claros de descumprimento das medidas judiciais, como a ausência de recolhimento noturno, deslocamento pelo estado em direção à fronteira com o Paraguai e perda total de sinal da tornozeleira desde a madrugada, a Polícia Penal catarinense só foi ao condomínio onde Silvinei residia por volta das 20h do dia 25/12. No local, encontrou o apartamento vazio e a garagem sem o veículo.
Ainda assim, a Polícia Federal só foi acionada às 23h do dia 25/12, quando retornou ao endereço e confirmou o que já era evidente: o monitorado havia fugido.
Entre a saída registrada pelas câmeras e o aviso formal à Polícia Federal, transcorreram cerca de 27 horas, um intervalo decisivo. Tempo suficiente, como ironizam investigadores, para Silvinei Marques cruzar a fronteira, chegar ao Paraguai, descansar, tomar banho, trocar de roupa, deixar o cachorro com algum conhecido ainda não identificado e tentar embarcar no Aeroporto de Assunção com um documento falso e uma versão considerada fantasiosa pelas autoridades.
Silvinei acabou preso na capital paraguaia vestindo bermuda e camiseta, aparentemente já sem o cão que o acompanhava na saída de Santa Catarina. O desfecho, porém, não apaga as perguntas centrais que permanecem sem resposta: por que um monitorado de alto risco teve sua fuga percebida, verificada e comunicada com tamanha lentidão? Houve apenas incompetência operacional ou conivência deliberada?
A cronologia dos fatos transforma o episódio em mais do que uma simples fuga: trata-se de um caso que coloca sob suspeita a atuação da Polícia Penal de Santa Catarina e exigindo apuração sobre responsabilidades administrativas e eventuais vínculos políticos que possam ter facilitado a evasão.
Fonte: Folha de S. Paulo – Estadão e Metropoles







