Testemunhos de soldados israelenses detalham demolição de residências, áreas agrícolas e industriais, levantando questões sobre a necessidade e proporcionalidade da medida.
Um relatório divulgado nesta segunda-feira (7) pela organização israelense de veteranos Breaking the Silence expõe a extensão da destruição causada por equipes do Exército de Israel na Faixa de Gaza. Segundo o documento, vastas áreas agrícolas, distritos residenciais inteiros e zonas industriais foram nivelados para a criação de uma ampla zona restrita ao redor do território palestino. Os relatos, baseados em depoimentos de soldados que serviram em Gaza durante a operação, descrevem o uso de escavadeiras, explosivos e minas para "limpar" o território.
A zona de segurança, que inicialmente variava entre 800 e 1.500 metros de profundidade dentro de Gaza, foi posteriormente expandida em meio ao conflito. Israel justifica a medida como necessária para evitar a repetição do ataque de 7 de outubro de 2023 do Hamas, que conseguiu romper a antiga barreira de 300 metros para atacar comunidades israelenses vizinhas, resultando em 1.200 mortes e 251 reféns.
No entanto, os testemunhos dos soldados levantam sérias questões sobre a proporcionalidade e a necessidade de tamanha destruição. Um capitão do corpo de blindados descreveu a área de fronteira como "uma zona de morte, uma área mais baixa, uma planície". O relatório indica que cerca de 3.500 edifícios foram destruídos na expansão inicial da zona, juntamente com extensas áreas de cultivo e parques industriais que poderiam ser cruciais para a futura reconstrução de Gaza. Um relatório paralelo da organização israelense Gisha estima que aproximadamente 35% das terras agrícolas da Faixa de Gaza foram devastadas, muitas delas localizadas nas áreas de fronteira.
Um soldado da reserva que atuou no corpo de blindados comparou a cena da destruição a Hiroshima, enquanto outro militar da unidade de engenharia de combate expressou seu choque ao presenciar a devastação causada pelo bombardeio inicial antes mesmo da operação de limpeza. "Foi surreal, mesmo antes de destruirmos as casas quando entramos, era como se você estivesse em um filme", relatou, questionando a justificativa para a extensão da destruição: "O que vi lá, tanto quanto posso julgar, estava além do que posso justificar como necessário. É uma questão de proporcionalidade."
Os relatos detalham a destruição de plantações de oliveiras, berinjelas e couve-flor, além de áreas industriais que abrigavam grandes fábricas, incluindo uma da Coca-Cola e uma farmacêutica, reduzidas a "montes de escombros".
O relatório também aborda as regras de engajamento na zona restrita, com soldados relatando que palestinos que se aproximam são alvejados. As regras, segundo os testemunhos, seriam flexíveis e dependentes das decisões dos comandantes no local, com relatos de que homens adultos vistos na área de segurança são geralmente mortos, enquanto tiros de advertência seriam disparados em direção a mulheres e crianças. Um capitão do corpo de blindados afirmou a falta de um sistema geral de responsabilização nessas decisões.
Embora o Exército de Israel não tenha se pronunciado sobre o relatório, o documento do Breaking the Silence lança uma luz preocupante sobre os métodos utilizados na criação da zona de segurança em Gaza e o impacto devastador sobre a população e a infraestrutura do território palestino. O relatório se baseia em depoimentos de soldados que atuaram na região entre o final de 2023 e o início de 2024, não abrangendo as operações mais recentes de expansão da área controlada pelas forças israelenses.
*Fonte: www1.folha.uol.com.br
