Desde janeiro de 2023, a Petrobras reduziu em R$ 1,22 por litro o preço do diesel vendido às distribuidoras — um corte de 34,9%, que, corrigido pela inflação, equivale a um alívio de R$ 1,75.
No entanto, quem abastece seu caminhão, ônibus ou gerador mal sentiu o impacto: no mesmo período, o diesel caiu meros 3,18% no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A diferença gritante escancara uma realidade desconcertante: o consumidor está sendo lesado por um sistema dominado por margens opacas, interesses concentrados e, cada vez mais, suspeitas de cartelização.
Mesmo com o barateamento do petróleo no mercado internacional e o compromisso da Petrobras com uma política de preços que privilegia o mercado interno, os valores nas bombas seguem altos. O mais recente exemplo é a redução de R$ 0,45 aplicada pela estatal entre abril e maio de 2025. Nas bombas, essa queda foi de apenas R$ 0,21 — menos da metade. Como justificativa, os postos alegam estoques antigos e carga tributária. Mas os dados e os fatos indicam outra narrativa.
O diretor de Logística e Comercialização da Petrobras, Claudio Romeo Schlosser, foi direto: “Infelizmente, esse valor não está sendo percebido pelo consumidor final”. A presidente da estatal, Magda Chambriard, foi além: pediu que o consumidor pressione os postos e pergunte “qual é o tipo de margem” aplicada e “se essa margem é tolerável”. A resposta, até agora, tem sido o silêncio — ou a velha ladainha de custos operacionais e tributos.
Mas a estrutura de preços mostra outra coisa. Hoje, apenas 47,4% do valor do diesel nas bombas corresponde à venda feita pela Petrobras. Distribuidoras e postos se apropriam de 17,4% — um percentual significativo em um setor que deveria operar com margens moderadas, dada sua importância estratégica. Tributos estaduais e federais somam mais 23%, o que compõe o restante da equação.
Especialistas como o economista Gilberto Braga denunciam o que consideram um "represamento intencional" das reduções de preços ao longo da cadeia. A prática, segundo ele, é típica de um ambiente com baixa concorrência real. “Essas margens estão sendo apropriadas por intermediários e não chegam ao consumidor final”, afirma.
A Agência Nacional do Petróleo (ANP), por sua vez, reconhece que os preços são livres desde 2002. Porém, a liberdade de mercado não é sinônimo de impunidade. A falta de repasse generalizado levanta suspeitas de acordos tácitos entre distribuidoras e postos, prática que pode configurar cartel, crime contra a ordem econômica.
O papel das distribuidoras também está no centro da polêmica. A Vibra Energia, ex-BR Distribuidora e atual líder de mercado com 23% de participação, manteve silêncio diante das críticas públicas feitas pela presidente da Petrobras. A empresa — que segue usando a marca BR, associada historicamente à estatal — é hoje um símbolo da privatização mal gerida: se beneficia do prestígio da Petrobras, mas adota práticas comerciais que traem esse legado.
Enquanto isso, o consumidor paga a conta — literalmente. O diesel, combustível vital para o transporte de alimentos e mercadorias, poderia ser uma ferramenta no combate à inflação, hoje em 5,53% — acima da meta oficial. Mas, ao invés disso, a inércia de distribuidoras e a conivência de postos acabam por sabotar o efeito positivo das ações da Petrobras. A promessa de um combustível mais barato esbarra na realidade de um setor marcado por lucros desproporcionais e pouca transparência.
O país, que tanto se debate por justiça social e eficiência econômica, não pode tolerar um mercado que suga o consumidor sob o manto da “liberdade de preços”. Se não há repasse, se não há competição, o que há é abuso — e este merece resposta firme das autoridades, do consumidor e da sociedade.
*Fonte: agenciabrasil.ebc.com.br