Não é só amizade. É uma jogada geopolítica calculada, e o almoço grátis do empresariado brasileiro pode estar com os dias contados.
Em uma impressionante demonstração de multitarefas presidencial, o líder da nação mais poderosa do mundo, Donald Trump, conseguiu destrinchar complexos dossiês de segurança nacional, gerenciar várias guerras, e mesmo assim encontrar uma brecha em sua agenda para oferecer um ombro amigo ao deputado federal Eduardo Bolsonaro.
O motivo do lamento? As “injustiças” políticas e legais sofridas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, fiel escudeiro sul-americano de Trump.
Claro, alguns podem atribuir este gesto a uma simples simpatia pessoal ou a uma afinidade ideológica entre dois cavalheiros que compartilham um amor incomum por teorias da conspiração e um desdém similar pelas delicadezas das instituições democráticas. A realidade é mais cínica e mais interessante.
Solidariedade ou geopolítica? O comportamento do presidente americano é, na verdade, um manual de realpolitik aplicada. É do interesse estratégico de Trump expandir e consolidar seu poderio sobre a América do Sul. E que modo mais barato de fazê-lo do que dando suporte moral, e quem sabe, mais do que isso, a políticos locais que já se provaram serem figuras alinhadas às suas pretensões em relação ao expansionismo da dominação estadunidense sobre a América do Sul.
A equação é simples: enquanto aplica um tarifaço que espeta o agronegócio brasileiro como um alfinete, por outro lado, oferece um abraço de urso ao ex-presidente Bolsonato que representa esse mesmo agronegócio. Pode parecer contraditório? Apenas para quem não entende que a pressão econômica e a aliança política são duas faces da mesma moeda: a dominação.
Eleições 2026 – o objetivo final, porém, vai muito além de um gesto de consolo. É uma jogada de xadrez para 2027. Pesquisas apontam que 35% dos brasileiros acreditam que “a culpa de tudo” é do atual presidente Lula. Este número não é uma mera estatística, é um farol para a estratégia Trump.
O grande intuito é colocar, a partir de janeiro de 2027, um presidente subserviente aos seus interesses geopolíticos, econômicos e políticos dos EUA. Um presidente brasileiro que veja os EUA não como um parceiro, mas como um patrão.
Protótipo na Argentina – o modelo já foi testado com relativo sucesso no país vizinho com Javier Milei. Agora, falta replicá-lo no maior país da região. Falta fortalecer a influência não só sobre autoridades políticas brasileiras, mas, e principalmente, sobre o empresariado. A mensagem subliminar é clara: “Apoiem meus amigos, e os ventos podem mudar. Apoiem meus inimigos, e o tarifaço é só o começo.”
Enquanto o Brasil debate seu futuro e tenta lidar com seus próprios demônios internos, o presidente de uma nação estrangeira já está escolhendo seu candidato na corrida presidencial brasileira. E o faz não por bondade, mas porque enxerga neste um fiel escudeiro para o sucesso da política externa dos EUA para América do Sul
No grande teatro das relações internacionais, o show de solidariedade de Trump para com os Bolsonaros não é um drama de amizade. É uma comédia, onde o protagonista norte-americano ri por último, planejando quem vai ser o próximo ator a subir ao palco do Planalto, desde que faça continência à bandeira estadunidense e cante o hino “The Star-Spangled Banner“.

Por Marco Antônio Mourão