Petrobras paga a acionistas mais do que deveria

Se um relatório da gestora de fundos inglesa Janus Henderson ranqueou a Petrobras na segunda posição global em pagamentos de dividendos (lucros) em 2022, o que poderia ser visto como um sucesso corporativo esconde nas entrelinhas uma política que segue na contramão de uma gestão empresarial eficiente.

Única empresa latino-americana presente entre as vinte mais bem posicionadas no documento, com US$ 21,7 bilhões estimados (R$ 112,9 bilhões) para seus acionistas em 2022, a Petrobras desde 2016 tem deixado de lado investimentos importantes para sua atividade em detrimento de repasses acima do seu lucro para a satisfação de seus acionistas.

Mais do que isto, no período de Jair Bolsonaro na presidência da República, a venda de ativos como refinarias, gasodutos e sua distribuidora também entraram na conta para engordar os recursos destinados aos rentistas, em sua maioria fora do Brasil.

Segundo a Janus Henderson, a Petrobras só não foi a maior pagadora do mundo por questões meramente tributárias.

No topo ficou a mineradora e petrolífera anglo-australiana BHP Billiton. Ela teve números brutos superiores, mas entregou um montante líquido menor aos seus acionistas.  O motivo – escancara outra distorção: o Brasil ao lado da Estônia não tributa dividendos.

Mas os números da gestora não refletem totalmente a realidade. Concretamente, somente pelos três primeiros trimestres de 2022 o repasse de dividendos da Petrobras já chegou na casa dos R$ 180 bilhões.

A discrepância se dá porque os valores do relatório são calculados na forma bruta, utilizando a quantidade de ações na data de pagamento e convertidos utilizando a taxa de câmbio vigente.

Segundo a Janus Henderson, é um resultado aproximado em um cenário onde as empresas fixam a taxa de câmbio um pouco antes da data de desembolso.

Lucro histórico da Petrobras

Com a divulgação nessa quarta-feira, 1º, da totalização de R$ 188,3 bilhões de lucro da Petrobras em 2022 e a intenção de pagamento de dividendos referentes ao quarto trimestre proposto na ordem de R$ 35 bilhões, a petroleira na realidade vai acabar transferindo para seus acionistas mais do que todo o seu lucro no período. Uma lucratividade que entra para a história como o maior não só da empresa, mas de todas as brasileiras.

Valores que seguem o destino dos anos anteriores, com a maior parte para fora do Brasil, 43%. Internamente, 20,2%, ficam com investidores privados nacionais e 36,8% para a União e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES). Concretamente, com 28,9% dos papéis na União e 7,9% na carteira do BNDES, R$ 66,2 bilhões engordaram a caixa do governo.

Dados do próprio mercado que fez na última terça-feira, 28, uma queda forte nos papeis da petroleira diante dos sinais de mudança na política de dividendos, dão uma ideia das proporções das medidas adotadas sob o comando da equipe econômica do presidente que passou para a história do Brasil como o primeiro não reeleito.

Na contramão do mercado

Enquanto a maioria das companhias listadas na bolsa brasileira distribui 25% do seu lucro líquido ajustado, a Petrobras em média repassou aos seus acionistas mais do que ela lucrou. Isso, além de incorporar nos pagamentos parte dos valores da venda de seus bens sob a batuta de Paulo Guedes.  Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o fato é inédito.

Até o segundo ano do mandato de Bolsonaro, registra o Dieese, o máximo de dividendos pagos pela estatal foram 54% no ano de 1996. A média, no entanto, de 1995 a 2019 era o repasse de 30% do lucro.

No segundo ano de Bolsonaro, 2020, porém, esse percentual atingiu 145%. Baixou para 95% em 2021 e só nos dividendos distribuídos com referência aos três primeiros trimestres contabilizados pela empresa em 2022 chegou a praticamente 100% dos lucros que foram verificados, na casa dos R$ 180 bilhões.

Experiente gestor de fundos que solicitou anonimato ao Extra Classe declarou que, no seu entendimento, isso deixa claro “uma certa hipocrisia” das chamadas forças de mercado.

 A lógica da drenagem

“Se de um lado prega a tal eficiência empresarial, de outro, fecha os olhos à drenagem que foi promovida na Petrobras nos últimos quatro anos. Qual a sustentabilidade que terá uma corporação sem ter recursos para investir no próprio negócio?”, indaga.

Obviamente, afirmou o gestor de fundos, essa hipocrisia não é gratuita. “Toda a lógica que estava sendo construída no governo anterior era, primeiro, garantir a reeleição do presidente; segundo, privatizar a Petrobras. Simples assim”, declara sem esconder o caráter especulativo do negócio em que atua.

Uma ameaça ao futuro da Petrobras

Eduardo Costa Pinto, Professor de Economia Brasileira e Economia Política da Universidade Federal do Rio de janeiro (UFRJ), entende que desde a implantação do Preço de Paridade Internacional (PPI) após a derrubada da presidente Dilma Rousseff em 2016 a Petrobras tem lucrado muito e gasto pouco com ganhos que sobem mais rápido do que as despesas para a extração do petróleo do pré-sal.

Segundo o professor, com a manutenção do PPI, a estatal maximiza o lucro ao cobrar o preço máximo possível dos combustíveis. É pela receita, bastando  “acompanhar os níveis internacionais, com frete e imposto, e vendendo pelo preço de monopólio”, explica. 

 Mas, para Costa Pinto, o pagamento de dividendos tão altos com o repasse de recursos arrecadados inclusive com a venda de patrimônio acaba não sendo benéfico para a empresa.

Em artigo publicado por ocasião da divulgação dos resultados do segundo trimestre da Petrobras, ele disse que o caixa feito no período e os recursos da venda do patrimônio deveriam ser reinvestidos na própria empresa. “A Petrobras parou de investir”, sentenciou.

Dados do próprio Ministério das Minas e Energia (MME) atestam isto. Enquanto em 2021 a média de lucratividade das nove maiores petroleiras do mundo ficou em 12,2% do patrimônio líquido, a Petrobras por não ter reinvestido parte das receitas de sua operação lucrou 40,1%.

É uma grande ameaça para a empresa porque cada vez mais suas concorrentes têm investido na busca de iniciativas para transição energética. Isso diante de fenômenos como o aquecimento global que torna a pressão para que a utilização de petróleo seja reduzida uma realidade. Desde 2016, após a posse de Michel Temer (MDB), a empresa tem deixado de lado projetos de energia solar, eólica e biocombustíveis entre outras áreas.

População penalizada

Trabalho apresentado no final de outubro passado pelo Dieese sobre a alta lucratividade da Petrobras é categórico: a política de preços de combustíveis praticada pela empresa penaliza a população.

De acordo com o estudo, entre 2003 e 2016, “a gasolina, diesel e GLP (gás) subiram de preços nas refinarias bem abaixo do crescimento do salário mínimo e da inflação”.

Foi com o advento do PPI que se iniciou a escalada inflacionária dos combustíveis que acabou contaminando toda a economia nacional.

Se por um lado o governo Bolsonaro com o objetivo de reduzir o preço dos combustíveis fez um forte ataque aos impostos, fazendo com que estados deixassem de arrecadar para tocar seus projetos e políticas sociais, de outro, não mexeu no mecanismo que drenava recursos da Petrobras muito acima dos praticados no mercado para seus acionistas.

De fato, essa é a opinião de boa parte de integrantes do governo Lula e de sua base de apoio que questiona ainda a decisão da Petrobras em 3 de novembro passado de antecipar o pagamento de R$ 43,7 bilhões de dividendos para seus acionistas.

“Isso é uma irresponsabilidade com a empresa e com o país. É a farra do Paulo Guedes para cobrir os gastos eleitorais do governo Bolsonaro”, afirmou Gleisi Hoffmann, presidente do PT Nacional, integrante na época da equipe de transição.

Sobre o registro da Petrobras como a segunda maior pagadora de dividendo do mundo, o deputado federal Alexandre Lindenmeyer (PT/RS) sintetiza ao emitir sua opinião de apoio a outra declaração dada pela presidente do PT Nacional, após coletiva dada pelos ministros da Fazenda e de Minas e Energia, Fernando Haddad (PT/SP) e Alexandre Silveira (PSD/MG).

“Enquanto o brasileiro pagava uma das gasolinas mais caras do mundo, a Petrobras foi a segunda empresa que mais pagou dividendos no mundo em 2022. É mesmo indecente, como disse a presidenta Gleisi. A Petrobras precisa de uma política de preços mais justa. E essa mudança está perto de acontecer”, registrou em suas redes sociais.

Por www.extraclasse.org.br

Compartilhar

Comentar

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Ofertas

Rádio

Cotação Diária

BRL/USDR$5,49
BRL/EURR$6,45
BRL/BTCR$609.988,89
BRL/ETHR$14.040,66
08 jul · CurrencyRate · BRL
CurrencyRate.Today
Check: 08 Jul 2025 07:05 UTC
Latest change: 08 Jul 2025 07:00 UTC
API: CurrencyRate
Disclaimers. This plugin or website cannot guarantee the accuracy of the exchange rates displayed. You should confirm current rates before making any transactions that could be affected by changes in the exchange rates.
You can install this WP plugin on your website from the WordPress official website: Exchange Rates🚀
Edit Template

Youtube

*Os textos publicados são de responsabilidade exclusiva do autor e não refletem, necessariamente, a opinião deste veículo de comunicação ou de seus controladores.

*Proibida a reprodução total ou parcial, cópia ou distribuição do conteúdo, sem autorização expressa por parte desse portal.